terça-feira, 16 de agosto de 2011

A cientificidade da história – Refutações das ideias dos “historiadores artistas”

Por: Estevam Machado

            Sinceramente não entendo o pavor que ronda a cabeças dos historiadores atualmente no que tange a cientificidade da história. De certo que houve um excesso na interpretação de autores negacionistas  como Nietzsche, e por consequência Foucaut, - não estou aqui tirando o mérito desses autores na formação dos novos historiadores que precisam ter uma cultura histórica elevada e amplificada. O grande problema é a dogmatização de suas propostas, que evitam comparações com outras concepções, fazendo da sala de aula na universidade um verdadeiro catecismo que prega a negação por completo da realidade expressa pela linguagem, do sujeito, e do indivíduo -. Talvez seja por isso que a história sofre com uma crise de identidade que geram polêmicas infindáveis, principalmente sobre a sua própria conceituação.
            Então, antes de afirmar com letras garrafais: “ HISTÓRIA É CIÊNCIA”, é necessário se ater a própria epistemologia, e como os novos historiadores expõem seus preconceitos para com a ciência.
            Para esses historiadores pseudo-vanguardistas, a ciência é uma coisa estática, por que há uma fobia generalizada em relação ao positivismo, porém isso não quer dizer que todos os historiadores que defendem a historicidade sejam positivistas e nem marxistas dogmáticos.   
            É esse preconceito primeiro que fecha os olhos para melhor analisar a situação, se esses historiadores realmente estudassem história, iriam perceber que ciência é debate, exposição de idéias divergentes, é contraposição por excelência. Se ciência é permanência, porque Galileu contestou as idéias vigentes em sua época sobre a  ordenação do sistema solar? Este era um cientista, não deveria seguir a ordem, como dizem os novos historiadores? E Colombo, que por utilização das ciências náuticas descobriu a América e provou a esfericidade da terra.
Se a ciência fosse estática, os cientistas não inovariam, não se tornariam nem cientistas, na verdade. Estagnariam no período da técnica.
Na ciência não existe verdade absoluta, e sim uma busca pela verdade, assim como, principalmente, no campo da ciência histórica, há um compromisso com a verdade, mesmo que ocorra na escrita do historiador um acesso de subjetividade, o leitor preparado separará o  “campo da opinião” do campo científico, isso se explicita na leitura de autores como Diacov e Covalev, por exemplo, que devido as suas orientações políticas analisam o passado de forma um tanto que arbitrária, porém pode se separar o caráter objetivo/científico do texto da parte subjetiva que revela as intenções desses autores, fazendo isso, o leitor percebe a riqueza científica existente nessas coleções sobre história antiga.
É triste perceber que estão se formando historiadores que não enxergam na ciência, e principalmente na ciência histórica, um dinamismo que lhe é peculiar e se atém a um maniqueísmo da dialética, quando o mundo é muito mais complexo que um choque entre opostos, e os novos estudos sobre escravidão em diversas partes do mundo e também no Brasil, por exemplo, apontam que não só existia só a luta entre o senhor e o escravo, barganhas, serviços extra-oficiais, e até mesmo interação mútua também fazia parte dessas sociedades. A dialética não explica tudo. Tanto é que Heráclito se ateve entre o doce e o salgado e se esqueceu do amargo e do azedo.
Não se pode dispensar o grande papel da filosofia na ciência histórica ,porém o historiador não é filosofo, nem tampouco artista que se expressa a partir da interpretação do passado, ele pode sim se valer da filosofia, porém fazer dela e de sua interpretação pessoal do mundo as principais fontes para se escrever é no mínimo narcisista e irresponsável .
O historiador interpreta o fato, como qualquer outro cientista, porém após uma longa caminhada que requer uma habilidade em coletar e separar as fontes, analisar uma bibliografia a cerca do tema, fazer críticas sobre a documentação, o interessante é que muitos que criticam a historicidade se valem de instrumentos destas para compor seus escritos, “nada surge do nada”.
Desculpem-me, por favor, os “historiadores artistas” que enfeitam páginas e páginas de neologismos desnecessários para acrescentar tão pouco a história, se estou sendo deveras ácido em meus comentários, é que são inúmeras aulas assistidas que são verdadeiras doutrinações acadêmicas em que tenho que ater minhas convicções, e como tive a oportunidade desta válvula de escape, estou aproveitando, por isso peço desculpa, porém não retiro o que disse nenhuma palavra que escrevi e ainda escreverei outras tantas.
“Ah... mas Heródoto, o pai da historia não precisou de arrogantes metodologias científicas para analisar a sociedade”, dizem os “historiadores artistas” é claro que ele não poderia dispor de uma ferramenta que não existia e todas as ciências não começam como tal. A física é originária da mecânica, a química da alquimia, a história da narrativa, as ciências médicas do curandeirismo, etc. Existe sim uma evolução e não percebê- la é retardar o conhecimento histórico.
Esses novos historiadores conhecem as ciências e disciplinas auxiliares da história, porém têm por estas, desprezo incomensurável colocando num altar apenas as concepções filosóficas teóricas, esquecendo da demografia, paleografia, economia, heráldica, numismática, sociologia, arqueologia, etc.
A ciência é aglutinadora e para fins didáticos a ciência histórica percebeu o quão difícil seria explicar para leigos estudantes as particularidades de civilizações próprias, então, se faz necessário fazer uma série de generalizações, onde as principais características comuns de povos que compartilhavam o mesmo campo temporal e estavam próximos geograficamente, surge, por exemplo, o estereótipo do homem feudal, ligado a terra e a igreja, porém sabe-se que este homem é típico da Inglaterra, França, Alemanha, enquanto isso as cidades-estados italianos floresciam no comercio, e os Vikings impunham suas forças no Norte da Europa, a questão da generalização é um problema, reconheço, mas é mais uma prova da cientificidade, a fervura da água, é um exemplo interessante nesse caso, ela ferve a 100 °C nas chamadas CNTP (Condições normais de temperatura e pressão), se a temperatura ambiente ou a pressão, ou ambas, não estiverem na CNTP, a água ferverá quando alcançar a temperatura. Para fins didáticos tanto as ciências ditas exatas quantos as ciências humanas se utilizam de generalizações, porém, é bom que fique claro que estes argumentos não fazem sentido no estudo mais especializado do historiador-cientista que se apega aos mínimos detalhes, isso porque os inimigos da cientificidade têm essa característica de pegar pontos específicos e generalizar para dar maior embasamento aos seus preconceitos.
Outra característica dos “historiadores artistas” é a confusão nas palavras, estes que são bem versados na escrita e utilizam de conceitos ambíguos para justificar suas ideias, “Ah... mas se atribuirmos ao conceito de ciência a utilização de métodos, o que poderíamos de tantos artistas e filósofos que seguem um padrão interpretativo da arte ou da vida? Picasso e a cientificidade do cubismo?” A primeira confusão é a igualação entre método e padrão interpretativo. O método é a arma que vou utilizar em minha pesquisa – história oral, documentos oficiais, iconografia, etc. – e padrão interpretativo é a forma que o indivíduo entende o resultado de várias pesquisas, entende as diferenças na unidade. A filosofia não tem método, ponto. Todas as conclusões tiradas pelos filósofos são formadas pela interpretação livre e sua escrita, tanto a filosofia quanto a arte não têm compromisso com a verdade, diferentemente dos historiadores e demais cientistas. A segunda confusão nesse parágrafo é quando se diz: “O historiador é um artista da expressão do passado”. A frase é bonita, porém entra em conflito com a proposta do autor expressa no título do texto. “História – Além da arte da filosofia e da ciência,” no início do texto o leitor pensa que a história é uma nova categoria distinta da arte, da filosofia e da ciência, porém depois é dito que o historiador é artista, e o autor se perde na própria conceituação. E Picasso ser cientista por ter um estilo artístico, não é ironia do autor, foi um presente para o meu texto.
Então, como a história tem método ela é CIÊNCIA, história sem método não é história e sim filosofia da história, sendo muitas vezes palco de especulações à cerca dos acontecimentos pretéritos, não sendo, portanto, uma historiografia clara, distinta e com compromisso com a ética e a verdade histórica.              

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