Rafael
Santana Bezerra
Se
um dia fosse possível fazer uma história das ideias globalizantes perceberíamos
como ela estaria repleta de violência e sangue. A II Guerra Mundial foi o palco
onde mais uma proposta de perfeição revelou a catástrofe das ideologias
etino-centristas. O Nazismo mergulhou no engano de absorver as máximas do
progresso técnico ao mundo social e orgânico. Arianismo na Alemanha do inicio
do Século XX era sinônimo de pureza.
A
proposta política e social do nazismo era claramente estabelecida. A limpeza racial
era o motor do desenvolvimento humano e econômico, eliminar os judeus e os
incapazes era essencial para retirar da Alemanha o seu status coadjuvante no
panorama mundial. O Arianismo foi se constituindo como o modelo de homem
perfeito, é a ideia da perfectibilidade do gênero humano. Hitler aliou-se a uma
gama de cientistas, arquitetos, músicos, médicos, juntos construíram um projeto
de um novo Império Alemão. Criou-se uma medicina que desejava afastar do corpo
perfeito os males contagiosos, eliminar os incuráveis.
O
Expressionismo revelava ao mundo os seus próprios problemas, é a arte do
mal-estar da civilização, é a expressão da dor, da guerra, da desilusão ante o
progresso técnico e cultural. Aos nazistas o Expressionismo ganhava o caráter
de arte degenerada, era a produção dos não racionais, dos incapazes, dos
judeus, dos sujos, dos não arianos, uma arte que deveria ser banida de todo o
“império germânico”, a contaminação através das imagens pintadas pelos
“alienados” era perigosa e colocava em risco o projeto de uma nova e superior
Alemanha.
A fantástica histeria
do povo alemão foi fruto, sobretudo, das incisivas políticas de propaganda do
partido nazista. Hitler mostrava aos alemães que o futuro era uma catástrofe
singular, e que o nazismo era a única saída vitoriosa, eles eliminariam os
impuros e retirariam os arianos da decadência. O documentário sueco do diretor
Peter Cohen percorre essa estratégia metodológica de recriar a mentalidade do
povo adepto às ideologias nazistas através das antigas propagandas. Os Judeus
eram denominados ratos e deveriam ser destruídos, eram responsabilizados pela
desonra, pela sujeira, pela destruição da civilização germânica.
A luta de classes
deveria ser banida do mundo econômico, a ideação do bem-estar social germânico
perpassava quase que inevitavelmente pela própria limpeza do trabalho.
Condicionar ao proletariado alemão condições de limpeza, salários,
resumidamente, desejava-se o fim das insatisfações trabalhistas a partir da
purificação do trabalho.
“Arquitetura
da Destruição”, antes de se constituir como um documentário de análise
político-econômico da II Guerra Mundial é uma bela sugestão de inovação
metodológica para a escrita da história. O filme analisa os projetos
arquitetônicos de Hitler, as suas preocupações com uma definição de belas
artes, de uma maneira geral, denúncia às inquietações nazistas com a estética.
Uma gama de material
projetado por Hitler é revelada no filme, ela nos dá a sensação de uma
contrariedade histórica, nos, propõe, salve as incertezas do acaso, “o que
poderia ter sido”. As plantas arquitetônicas demonstram o desejo do grande
império, talvez, os escandalosos monumentos configurem-se como o simbolismo da
vitória, da perfeição. O documentário é uma bela narrativa das utopias, dos desejos
sádicos e imperialista do mundo nazista, é uma descrição dos projetos, das
intenções, das mentalidades.
O filme, entretanto,
cai no erro de ignorar o ódio dos nazistas pelos comunistas e partidários de
esquerda. Estes foram juntamente com homossexuais, deficientes, negros,
ciganos, judeus, alvos do projeto de pureza. A limpeza orgânica misturava-se
com as abstrações políticas, fazia-se na realidade uma limpeza à contrariedade
da ordem nazista e burguesa. O título de artista frustrado para Hitler é um
eufemismo à sua arte de destruir.
O
documentário de Peter Cohen nos propõe, talvez, muito implicitamente os perigos
da má interpretação do conhecimento histórico. Hitler mergulha numa empatia
perigosa pelas civilizações gregas, romanas e espartanas, uma simpatia que
privilegia as ações militares e universalizantes desses povos. Este é, quem
sabe, o maior perigo do historicismo, apaixonar-se pelos vencedores e basear-se
nas mesmas atrocidades do passado.